Teorema de Knaster–Tarski

O Teorema de Knaster–Tarski, por Bronisław Knaster e Alfred Tarski, é um resultado matemático em teoria da ordem sobre reticulados que diz o seguinte:

Seja L um reticulado completo e f : L → L uma função monótona. Então o conjunto de pontos fixos de f em L também é um reticulado completo.

O teorema determina ainda a forma geral do máximo e do mínimo do conjunto de pontos fixos de f. O teorema na sua forma mais geral, foi originalmente enunciado por Tarski;[1] e assim o teorema é muitas vezes conhecido como teorema do ponto fixo de Tarski. Antes disso, Knaster e Tarski conjuntamente estabeleceram este resultado para o caso especial em que L é um reticulado de subconjuntos de um conjunto.[2] Este teorema tem aplicações importantes na área de semântica formal de linguagens de programação e interpretações abstratas. O reverso deste teorema foi demonstrado por Anne C. Davis.[3] Assim sendo, verifica-se também o seguinte: Se toda e qualquer função monótona f : L → L num dado reticulado L tem pontos fixos, então L é um reticulado completo.


Teorema

Seja L , {\displaystyle \langle L,\leq \rangle } um reticulado completo f : L L {\displaystyle f\colon L\rightarrow L} uma função monótona. Considerem-se os conjuntos P {\displaystyle P} , P r e {\displaystyle Pre} e P o s {\displaystyle Pos} , dos pontos fixos, prefixos e posfixos de f {\displaystyle f} respetivamente, ou seja definidos por,

  • P = { x L f ( x ) = x } {\displaystyle P=\{x\in L\mid f(x)=x\}}
  • P r e = { x L f ( x ) x } {\displaystyle Pre=\{x\in L\mid f(x)\leq x\}}
  • P o s = { x L f ( x ) x } {\displaystyle Pos=\{x\in L\mid f(x)\geq x\}}

Então verificam-se os seguintes resultados,

  • P , {\displaystyle \langle P,\leq \rangle } é um reticulado completo
  • min   P = P r e {\displaystyle \min \ P=\bigwedge Pre}
  • max   P = P o s {\displaystyle \max \ P=\bigvee Pos}

Demonstração

Começamos por demonstrar que P tem mínimo e máximo, e que são respetivamente o supremo e ínfimo dos pontos prefixos e posfixos. Como ambos os casos são duais, apresentamos apenas a demonstração do primeiro, ou seja que o máximo de P existe e é o máximo de Pos. Como Pos contém P, basta demonstrar que o supremo de Pos pertence a P para concluir que é o seu máximo.


Lema 1: P o s {\displaystyle Pos\neq \emptyset }

Por definição, f ( x ) {\displaystyle \bot \leq f(x)} para todo x L {\displaystyle x\in L} . Daí resulta em particular f ( ) {\displaystyle \bot \leq f(\bot )} , ou seja P o s {\displaystyle \bot \in Pos} .

Lema 2: x P o s f ( x ) P o s {\displaystyle x\in Pos\implies f(x)\in Pos}

Para todo x p o s {\displaystyle x\in pos} tem-se que x f ( x ) {\displaystyle x\leq f(x)} , logo f ( x ) f ( f ( x ) ) {\displaystyle f(x)\leq f(f(x))} pela monotonicidade de f ( x ) {\displaystyle f(x)} , ou seja f ( x ) P o s {\displaystyle f(x)\in Pos} .

Lema 3: P o s P o s {\displaystyle \bigvee Pos\in Pos}

Seja u = P o s {\textstyle u=\bigvee Pos} . Para todo x P o s {\displaystyle x\in Pos} tem-se x u {\displaystyle x\leq u} , e também f ( x ) f ( u ) {\displaystyle f(x)\leq f(u)} pela monotonicidade de f {\displaystyle f} , do que resulta x f ( x ) f ( u ) {\displaystyle x\leq f(x)\leq f(u)} para todo o x P o s {\displaystyle x\in Pos} . Como u {\displaystyle u} o é menor dos majorantes então u f ( u ) {\displaystyle u\leq f(u)} , ou seja u P o s {\displaystyle u\in Pos} .

Lema 4: P o s P r e {\displaystyle \bigvee Pos\in Pre}

Seja u = P o s {\textstyle u=\bigvee Pos} . De u P o s {\displaystyle u\in Pos} (lema 3) e x P o s f ( x ) P o s {\displaystyle x\in Pos\implies f(x)\in Pos} (lema 2), resulta que f ( u ) P o s {\displaystyle f(u)\in Pos} . Portanto por definição de u {\displaystyle u} tem-se f ( u ) u {\displaystyle f(u)\in u} , ou seja u P r e {\displaystyle u\in Pre} .

Conclusão: P o s = max P {\displaystyle \bigvee Pos=\max P}

Dos lemas 3 e 4 resulta que P o s ( P o s P r e ) {\textstyle \bigvee Pos\in (Pos\cap Pre)} , ou seja P o s P {\textstyle \bigvee Pos\in P} . Como P P o s {\displaystyle P\subseteq Pos} , então o supremo de P o s {\displaystyle Pos} é também maior que todos os elementos de P {\displaystyle P} , e como pertence a P {\displaystyle P} é o seu máximo.


Prosseguimos demonstrando que P {\displaystyle P} é um reticulado completo. Isto é, que todo o U P {\displaystyle U\subseteq P} tem um supremo em U P {\textstyle \bigvee U\in P} .

É importante notar que o teorema não especifica que o supremo U {\textstyle \bigvee U} em P , {\displaystyle \langle P,\leq \rangle } é o mesmo que U {\textstyle \bigvee U} em L , {\displaystyle \langle L,\leq \rangle } . O teorema diz sim que, para todo o subconjunto de pontos fixos U {\displaystyle \langle U\rangle } , o conjunto de pontos fixos que o limitam superiormente tem um mínimo. Defina-se conjunto de majorantes de U {\displaystyle U} , na forma de intervalo, como [ u , ] = { x : u x } {\displaystyle [u,\top ]=\{x:u\leq x\leq \top \}} onde u = U {\textstyle u=\bigvee U} em L , {\displaystyle \langle L,\leq \rangle } . Este intervalo é trivialmente um reticulado completo. O objetivo é mostrar que a restrição de f : L L {\displaystyle f:L\rightarrow L} ao reticulado [ u , ] {\displaystyle [u,\top ]} tem um ponto fixo mínimo em [ u , ] {\displaystyle [u,\top ]} .


Lema 5: f : L L {\displaystyle f:L\rightarrow L} tem um ponto fixo mínimo em L {\displaystyle L}

Lema 6: f ( [ u , ] ) [ u , ] {\displaystyle f([u,\top ])\subseteq [u,\top ]}

Para todo x U P {\displaystyle x\in U\subseteq P} tem-se x u {\displaystyle x\leq u} por definição de u {\displaystyle u} , e x = f ( x ) f ( u ) {\displaystyle x=f(x)\leq f(u)} pela monotonicidade de f {\displaystyle f} e por u {\displaystyle u} ser ponto fixo. Consequentemente u f ( u ) {\displaystyle u\leq f(u)} , pois u {\displaystyle u} é por definição o menor majorante de U {\displaystyle U} , ou seja Como u {\displaystyle u} o menor dos majorantes então f ( u ) [ u , ] {\displaystyle f(u)\in [u,\top ]} .

Conclusão: A restrição de f {\displaystyle f} ao reticulado completo [ u , ] {\displaystyle [u,\top ]} é da forma f : [ u , ] [ u , ] {\displaystyle f:[u,\top ]\rightarrow [u,\top ]} . Aplicando o lema 5 (ao reticulado completo [ u , ] {\displaystyle [u,\top ]} ) conclui-se que f : [ u , ] [ u , ] {\displaystyle f:[u,\top ]\rightarrow [u,\top ]} tem um ponto fixo mínimo em [ u , ] {\displaystyle [u,\top ]} . Fica demonstrada a existência de valor mínimo entre os pontos fixos que limitam superiormente U {\displaystyle U} , ou seja a existência de U {\textstyle \bigvee U} em P , {\displaystyle \langle P,\leq \rangle } .

Ver também

  • Teorema do ponto fixo de Kleene
  • Teorema do ponto fixo de Kantorovitch
  • μ-calculo modal

Notas

  1. Alfred Tarski (1955). «A lattice-theoretical fixpoint theorem and its applications». Pacific Journal of Mathematics. 5:2: 285–309 
  2. B. Knaster (1928). «Un théorème sur les fonctions d'ensembles». Ann. Soc. Polon. Math. 6: 133–134  With A. Tarski.
  3. Anne C. Davis (1955). «A characterization of complete lattices». Pacific J. Math. 5: 311–319. doi:10.2140/pjm.1955.5.311 

Referências

  • Andrzej Granas and James Dugundji (2003). Fixed Point Theory. [S.l.]: Springer-Verlag, New York. ISBN 0-387-00173-5 
  • Forster, T. Logic, Induction and Sets. [S.l.: s.n.] ISBN 0-521-53361-9 

Leitura relacionada

  • S. Hayashi (1985). «Self-similar sets as Tarski's fixed points». Publ. RIMS Kyoto Univ. 21 (5): 1059–1066. doi:10.2977/prims/1195178796 
  • J. Jachymski; L. Gajek; K. Pokarowski (2000). «The Tarski-Kantorovitch principle and the theory of iterated function systems». Bull. Austral. Math. Soc. 61 (02): 247–261. doi:10.1017/S0004972700022243 
  • E.A. Ok (2004). «Fixed set theory for closed correspondences with applications to self-similarity and games». Nonlinear Anal. 56 (3): 309–330. doi:10.1016/j.na.2003.08.001 
  • B.S.W. Schröder (1999). «Algorithms for the fixed point property». Theoret. Comput. Sci. 217 (2): 301–358. doi:10.1016/S0304-3975(98)00273-4 
  • S. Heikkilä (1990). «On fixed points through a generalized iteration method with applications to differential and integral equations involving discontinuities». Nonlinear Anal. 14 (5): 413–426. doi:10.1016/0362-546X(90)90082-R 
  • R. Uhl (2003). «Smallest and greatest fixed points of quasimonotone increasing mappings». Mathematische Nachrichten. 248–249: 204–210. doi:10.1002/mana.200310016 
  • Brunner, Andreas B. M.; Malta, Paulo R. S. (2020). «Teoremas de ponto fixo de Banach e Knaster-Tarski, revistos» (PDF). Revista Matemática Universitária. 2: 1–21. doi:10.21711/26755254/rmu202021 

Ligações externas

  • J. B. Nation, Notes on lattice theory.